quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Rio de Janeiro

A cidade ainda é maravilhosa. Mas está podre por dentro. Carcomida pelo cancer que cresceu na incompetência e no descaso governamental, na ausência contínua do Estado nas comunidades, na destruição do sistema educacional, na desagregação das famílias ao longo de décadas.
Lembro-me muito bem: o Rio era a alegria, a beleza abraçada pelo carnaval. Carnaval que começou na inocência do passado, passou pela malícia dos bicheiros e foi tomado de assalto pelo dinheiro sujo do tráfico que corrompeu os morros e desceu sobre a cidade, como a lama que escorre do vulcão em chamas.
Lembro-me muito bem, 40 anos atrás, meu pai e avô comentando que a permissividade do Estado para com os bicheiros, principalmente em épocas de carnaval, teria ainda um preço alto a ser pago pela sociedade. Esse dia chegou. Eles não estão mais aqui para assistir isso tudo que estamos testemunhando.
Do inocente jogo do bicho, com a benção do Poder constituído, perdeu-se para os jovens que dominaram os negócios e transformaram-nos em tráfico de drogas e todo o tipo de porcaria que acompanha este negócio: prostituição e armas.
Os velhos e "bondosos" bicheiros, que davam suporte as comunidades mais pobres a quem o Estado deu suas costas, foram-se e deram lugar para os novos e valentes traficantes.
O mais bizarro nessa história toda, é ligar a TV e ver "entendidos" discutir a questão da educação - ou a falta dela - para os jovens que moram nas favelas do Rio. Eles dizem que os jovens, quando conseguem terminar o ensino médio, não fazem o vestibular por saberem que não tem chances... e ficam sem alternativa, já que não tem habilidade nenhuma para o mercado de trabalho e, fatalmente, resta-lhe o tráfico, a prostituição e negócios afins para seguir com sua vida.
Pois bem: o que ninguém fala ou por medo de falar a verdade, ou por desconhecimento intencional, ou por falta de vergonha na cara mesmo, é que tudo isso é resultado do desmanche do passado: acabaram com a escola técnica, aonde qualquer formando do ensino médio tinha uma profissão - fosse auxiliar de escritório, desenhistas, costureira, pedreiro, ou qualquer outra, mas era uma profissão. Acabaram com esta escola que funcionava para substituir por uma que não funciona, pois passou a não ser um fim, mas um meio caminho para uma faculdade que nem todos poderão fazê-la, já que não há e nem nunca haverá vagas suficientes para atender a todos. Pior do que isso é a qualidade desta escola que desabou: como disse um "entendido", 10% somente saem com conhecimento básico completo em matemática... que coisa linda, hein?
Pior ainda: ninguém tem coragem de dizer que a destruição do núcleo da sociedade é também um estopim para essa tragédia. Falo da FAMÍLIA que foi-se... virou uma miragem ou um retrato na parede. Uma saudade... nostalgia.
Com o Estado dando suporte para essa desagregação e degradação social, não há povo que resista. Destruindo o ensino, minando a família com leis que incentivam a separação e o divórcio, distribuição de camisinhas banalizando o sexo, dando margem a maternidade irresponsável e apresentam a solução mais atual: a permissão ao aborto.
Claro que jovem nenhum poderá resistir a tamanha desolação.
Ficam perdidos neste mundo, sem casa, sem pai ou mãe, sem orientação, sem educação, e sem perspectiva (e sem preocupação) com seu futuro. Coroa-se a tragédia com uma escola incompleta, carcomida pela indiferença... é tudo o que o tráfico e o crime quer. Mão de obra abundante, barata e descartável.
A situação é grave.
O futuro é incerto.
Se as ações dos responsáveis por garantir um mínimo de cidadania - polícia e governos - que assistimos nesta semana não for enérgica, permanente e, principalmente, acompanhada de ações sérias na restituição dos valores da sociedade - educação, família, saude, emprego, etc. - se esta ação não permanecer... teremos assistido mais um capítulo da quebra de braço entre o crime e a lei. Com mais uma vitória para o crime.
Ou o Estado assume de uma vez por todas... ou terá sido mais uma vez, vidas perdidas para custear palanques eleitoreiros.
Sou cristão e católico. E corinthiano. Não desisto.. tenho fé e esperança até o último segundo.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Achados mas não perdidos...

Fazendo a limpeza e reciclagem de todo o arquivo do escritório do meu falecido pai (por sucessão do meu avô), tenho encontrados algumas coisas interessantes. Na última revisão, encontrei dois livros:

1) IL CAFFÈ - Il suo paese e la sua impartanza (S. Paulo del Brasile). con 48 tavole, 7 diagrammi e carta delle zone caffeifere. De Ulrico Hoepli. Editora Libraio della Real Casa MILANO. 1910.




2) O Café - Observações Botanicas, producção, consumo; por F. Semler. Vertido do alemão por um velho fazendeiro. Typographia Salesiana, 1896. São Paulo.



Na primeira página do livro - IL CAFFÈ - há uma dedicatória... pena que só um especialista para entender o que está escrito...




Como está escrito, o primeiro livro - IL CAFFÈ - traz sete gráficos explicativos.

O primeiro dos "7 diagrammi" fala sobre a oscilação do preço médio do café, entre 1850/51 e 1909/10. A unidade de peso utilizada é 50kg. A unidade de valor é Liras.




No segundo "diagrammi", temos o comparativo da produção média de café: mundial, Brasil e outros países, em milhões de sacas, ente 1865 e 1910.




Já o terceiro "diagrammi" trás a produção média mundial de café, entre 1899/1900 e 1908/09, em milhões de sacas.




No "diagrammi" seguinte, 4º, é apresentado o consumo médio de café, em milhões de sacas, entre 1899/1900 até 1908/09.




No 5º "diagrammi", apresenta-se a divisão da produção mundial da safra 1908/09 de 16.685.000 de sacas de café, aonde São Paulo produziu mais da metade do café produzido no mundo, naquela safra: 10 milhões de sacas, seguido pelo Rio de Janeiro e Minas Gerais (juntos) com 3 milhões de sacas, e com Victoria e Bahia em terceiro, com 580.000 sacas. Ou seja, mais de 81% do café produzido no mundo, naquela safra, veio do Brasil!




Infelizmente, eu sou um ignorante em Italiano (uma vergonha para um Lazzarini, mas eu assumo...). Então o 6º diagrama ficará aqui, para quem puder ajudar e traduzir o que está escrito... agradeço antecipadamente!!! Salvo pela estimada amiga Jucelia Kohler:

Carissimo, não sou tão boa assim, mas aí vai:
"Diagrama de imposto de consumo de café ou de direitos de importação que se aplicam em vários países"




Enfim, o último "diagrammi"... mostra a exportação de café no ano de 1901/02 em sacas de 60kg, aonde cada saco da figura, representa 50mil sacas.




Note que, nesta safra, só o Brasil produziu quase o mesmo montante que a safra de 1908/09. Outra: Nesta safra (01/02), o mundo produziu aproximadamente 19,7 milhões de sacas de café: 82% foi produzido pelo Brasil.


Observando mais atentamente os dados dos gráficos: as safras mundiais entre 1902/03 e 1905/06 foram ruins - possivelmente os países produtores de café sofreram com o frio ou algum outro problema, exceto o Brasil, pois ele foi o responsável pela elevação das produção mundial, o que sustentou o abastecimento do consumo mundial crescente.Num momento inicial derrubou o preço médio do café (excesso de oferta?). Mas na sequência, mesmo numa produção crescente, o preço voltou a subir após 1905, quando o Brasil ganhou mais mercado, aumentando sua participação na produção mundial de 57% para 83%.


No livro "O Café", de Semler, 1896, há alguns parágrafos cuidadosamente assinalados a caneta (terá sido meu avô?). Dentre eles, destaco:

"Em quanto não se introduzir no commercio a praxe de avaliar-se a bondade do café por experiencias feitas com o café em infusão, há de servir de padrão o tamanho, a forma e a cor das favas."


"A discussão muitas vezes travada, com o fi de indagar-se a qual das qualidades de café deve se dar a palma, redunda em perda de tempo, prevalecendo n'estas materias o gosto individual. Mesmo o café Moka não faz excepção a esta regra, porque, tomado sem mistura, só agrada a pessoas acostumadas a café brandos. Sobre um ponto, todavia, não pode haver discussão: na preparação do café deve-se proceder como na do cacáo e do chá: deve-se fazer uma mistura de qualidades de café que se completem umas as outras. Existem varias qualidades de café de aroma delicado, mas cuja infusão tem pouco "corpo", expressão esta que passou do commercio do vinho para o café."


"O café Rioka é incontestavelmente melhorado com uma mistura de café Java. Se, porém, não se possuir alguma boa qualidade de café para misturar com as inferiores, deve-se usar de uma pequena adição de cacáo ou chocolate."


Ainda o mesmo livro "O Café", de Semler, 1896: o crescimento da exportação de café pelos portos do Rio de Janeiro e Santos:
"Em 1871-1872:
Rio de Janeiro = 246,600,000 libras
Santos = 59,400,000 libras
Total = 306,000,00 libras
Em 1880 - 1881:
Rio de Janeiro = 508,800,000 libras
Santos = 140,320,000 libras
Total = 649,120,000 libras
O augmento orçou nesses ultimos dez annos em 112%."

E, no final deste curioso livro, uma orientação:

"Quando o fazendeiro desejar estrumar o seu cafezal, o melhor alvitre, o mais scientifico e racional que tem de adoptar é simplesmente mandar á estação agronomica de Campinas uma amostra da terra, assim como a indicação da edade do cafezal.

O laboratorio de Campinas por pouco dinheiro, faz a competente analyse e mandará dizer a quantidade e a qualidade de estrume, que mais proveito lhe dará."


A visão "ecológica" do final do século IXX



Destruição das mattas


"Destruir soberbas mattas de terras uberrimas, que vão ser entregues para sempre à cultura, não é grande mal e mesmo não se podera recriminar contra esta pratica se toda a madeira de lei fosse aproveitada.

Mas destruir mattas ou capoeiras só para tirar duas ou tres colheitas, atear fogo em quasi um districto inteiro, para fazer verde para algumas cabeças de gado, queimar immensos campos e mattas pella locomotiva de estrada de ferro mal dirigida, ou arrazar florestas de ingremes morros, de profundas barrocas, de nascentes d'agua ou de beira-rio, ou inutilisar as mattas junto a centro populosos só para aproveital-as como carvão ou lenha, é simplesmente procedimento de bugres ou de vandalos e o governo ou mesmo as Camaras Municipaes deveriam com leis as mais severas pôr um paradeiro a tão insensato, quão imprudente procedimento.

Com a destruição exagerada das florestas o clima do apiz modifica-se completamente: as estações tornam-se irregulares, as chuvas, ora vem cedo, ora tarde, ou são copiosas demais, os rios tornam-se caudalosos e ha fortes inundaçõe ou então seccam quassi completamente, a ponto de não darem agua para fazer trabalhar a mais insignificante machina; os ventos estão sempre emprenhados de forte camada de pó, o calor, torna-se abrasador; tudo isso contribue para o mal estar dos habitantes e tambem para a irregularidade da producção, esterilisando o paiz pouco a pouco. Foi devido a esses motivos que no tempo antigo se deram as grandes emigrações de povos inteiros, pois os habitantes não encontravam mais na sua patria recursos para sustental-os, ainda que não fosse tão densa a sua população. Entretanto, se hoje os paizes os mais adiantados da Europa tem obtido maior producção, não é só isto devido a sua sabia agronomia, mas à sensata conservação que elles tem sabido dar a suas florestas augmentando-as diariamnte e apoiados por sabias leis que são fielmente cumpridas; isto tem tambem contribuido poderosamente para estabelecer um clima igual, havendo completa uniformidade na mudança das estações, augmentando sempre sua producção, até não lhe faltando nem lenha, nem madeira que é obtida por preço inferior ao que pagamos nós, o que não deixa de contribuir muito para o seu bem estar. Estas verdades começam a calar tanto o espirito dos outros povos, que importantes trabalhos têm sido executados ultimamente neste sentido na India e no Japão, sem contar as colonias Inglezas,onde já ha dezenas de annos que muita cousa se faz a esse respeito.

Portanto nós também devemos tratar de não destruir tanto as nossas mattas e fazer novas florestas em terras inuteis à lavoura e que para o futuro serão os grandes interesse pecuniario e verdadeira e solida herança de familia. Lembramos como arvores e florestas de rapido crescimento e de excellente madeira o cedro, o timbó, a cajarana, o pinheiro, o guarantan e muitas outras e as estrangeiras como os ecualiptus, as conifereas, os carvalhos, etc., etc., que em menos de trinta annos poderiam fornecer bem soffrivel taboado.

Para a a cultura dessas arvores ha despezas só nos primeiros 4 a 5 annos, porque depois a sua conservação pouco gastos occasiona; estamos convencidos que cada arvore faz um a dous mil réis de madeira por anno. Accresceria a vantgem destas terras muito augmentarem de valor, porque iriam pouco a pouco recuperando as suas forças productivas."


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Retirado do livro "O Café - Observações Botanicas, producção, consumo"; por F. Semler. Vertido do alemão por um velho fazendeiro. Typographia Salesiana, 1896. São Paulo.